Eustaquio Maia

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17/11/2006 - 21h55
Anorexia não é uma doença moderna: antes era espiritual, hoje é estética, diz autora
CAROLINA VASONE
UOL Estilo
Não é de hoje que moças de todo o mundo trancam a boca e jogam a chave bem longe, determinadas a, simplesmente, deixar de comer. Chamada hoje de anorexia nervosa, a doença, sem nominação no passado, acometeu santas e religiosas fervorosas bem antes de ficar famosa como o mal das modelos. Essa foi a conclusão a qual chegou a psicanalista Cybelle Weinberg, autora do livro "Do Altar às Passarelas - Da anorexia santa à anorexia nervosa" (Annablume Editora).
Lançada este mês, a obra traz a pesquisa da tese de mestrado da especialista, que também é coordenadora do CEPPAN (Clínica de Estudos e Pesquisa em Psicanálise da Anorexia e Bulimia Nervosa), em parceria com o psiquiatra Táki Athanássios, coordenador do Ambulim (Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares do Hospital das Clínicas). "A anorexia existe há muito tempo. O que muda é a motivação: antes era espiritual, hoje é estética", afirma Weinberg.
A literatura investigada pela psicanalista mostra que santas e outras religiosas passavam praticamente a vida sem comer. Isso, lá pelos séculos 14, 15, 16 e 17, significava morrer por volta dos 30 anos. "Elas comiam migalhas e chás de ervas amargas", conta a psicanalista.
Segundo Weinberg, em comum com as meninas doentes de hoje elas têm a personalidade. "São normalmente boas filhas, meigas, dóceis, com dificuldade em expor a agressividade, a raiva. Elas têm uma grande dificuldade de entrar na adolescência. É como se fosse (o ato de não comer e ir 'diminuindo' com o emagrecimento) uma regressão", diz.
Entre as "anoréxicas históricas" Weinberg destaca duas. No século 8, a santa portuguesa Wilgefortis parou de comer porque não queria casar. "Era comum as meninas ficarem anoréxicas para evitar casamentos arranjados", diz. Conforme a doença foi ficando mais grave, as unhas quebraram, o cabelo caiu e uma penugem foi crescendo no rosto e no corpo de Wilgefortis. "Isso pode acontecer em casos graves da doença", lembra Weinberg. O fato é que, por conta da penugem, Wilgefortis ficou conhecida como a "santa barbada". Morreu crucificada pelo pai e, embora nunca tenha sido canonizada, há inúmeras imagens dela pela Espanha e Portugal, que a conhecem por atender um pedido bem particular: desfazer casamentos indesejados.
Mais famosa e com várias seguidoras foi a santa Catarina de Siena, no século 14. Aos sete anos, na Itália, ela resolveu dedicar a existência, a virgindade e o apetite à Virgem Maria. E parou de comer.
Comum na sociedade de muitos séculos anteriores, a anorexia entrou para os registros médicos, pela primeira vez, no final do século 19, em 1690. Foi o médico inglês Richard Morton o primeiro a classificar a doença que acometeu uma jovem de 18 anos cujo ciclo menstrual chegou a ser interrompido pela desnutrição, de anorexia.
Na época, o médico ficou impressionado com a aparência cadavérica da garota que se recusava a comer.
Tão determinadas a não deixar passar uma refeição completa pela boca quanto as anoréxicas contemporâneas, as de antigamente se diferem das atuais apenas pelo objetivo. "A divisão entre corpo e espírito era a motivação. A idéia era desvalorizar a carne em sinal de uma elevação espiritual", afirma a psicanalista.
Fonte:
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