Conheci uma menina
Como um enigma
Que não se decifra
Pois o que só se olha
E se esquece de buscar resposta
Não merece sofrer de lógica
A vida nos pôs na passada
Que dá na mira do coração
[um do outro
Fomos juntos feridos
E juntos fomos o socorro
E, no que importa, parceiros
Para sempre [desde sempre]
Não faremos amor ou guerra
Romance ou o que o valha
Faremos a vida
– como ela é –
Valer mais a pena
Aprendi o que é conviver à altura
[só sabia que era possível
e sabia que me ria
de pensar que esse acaso
podia me abraçar um dia]
E como isso é silente e preciso
[em tudo
Que faz e em tudo que despreza!
Perfeito e posto de lado
Sim: perfeito e de lado
Sei lá como explicar isso
– sei que um idiota qualquer
o faria, mas disso basto eu,
que me amarro, sorrio
e me alegro em desespero –
Isso é coisa que eu gosto
Que aconteça e assim se faça
[sozinha
Sei lá. Talvez o meu único modo
De conservar perfeita uma coisa viva
Seja tirá-la a vida e fazê-la saudade
O prazer de virar a mesa
Porque ela me afronta
A insanidade de talhar
As melhores artes
Contemplá-las e
Quebrá-las
Para viver toda a amplitude
Que há das alturas até o nada
[um expectador do meu próprio teatro]
Consigo ver as coisas assim
Em crua dor, mas livres de maldade
Nunca me disseram que isso é certo
Mas não faço questão de ser quadrado
Não a amei como ensinam os livros
Mas assim, como se ama a liberdade
Eu estrago as coisas, é verdade
Sim, eu carrego no peito esta culpa
Mas com um coração de criança
[se não houvesse espelhos
ainda teria dez anos]
Que aposta tudo no brincar
E morre sem saber
O que a mata |