Que sentimento nos vem abraçar
Quando tudo que um dia era sonho
Tornou-se então a realidade
E ela é amarga
E ela é uma mentira
Contada à nossa esperança
Que aguardava quieta e ansiosa
Onde mora o começo de tudo
[que chora
Não foi azar [ou erro de cálculo]
Mas o impossível cultivado
O impossivelmente real
Longamente aguardado
Desde que me conheço
E desde que conheço as coisas
Tudo foi mentira; tudo.
Tudo foi encenação
Que se pensava preparação
De tão estupendo que sonhava
Tudo aquilo que haveria de vir
E tornar a vida plena e calma
Mas ah!... a biologia
Estaria de folga neste dia?
Eu, chafurdando num ritual do trivial
Num requinte social-bestial-distal?
Conto-me a mentira da historia da vida
E refaço o espaço onde a vida respira
Mas que pranto seco me desce à garganta
Quando dou por isso e me quedo
Pasmo e perplexo de tudo
De tudo que nunca será
Que nunca foi
E nem mesmo pode-se tentar
[ não porque não sou nada ]
[mas não aprendi a fingir]
[ não tanto assim ]
[não para mim...]
Nem mesmo se perder
E num delírio repintar o sonho
[da vida
Pois que nada novo nela se afixa
Já não creio em meios de viver o que esperava
Toda minha vida foi um erro porque sonhei
Sim: porque sonhei em vez de enxergar
Agora trago a ferro e fogo no peito
[ seu sonho é sua sina ]
É a miséria de ser um tolo porque tudo é tolice
E não poder saltar fora disso [fora do quê?]
Inda se pudesse, saltaria atrás dum sentido
E o único sentido seria no salto:
Ser tolo em solidão
Qual sentimento nos vem abraçar
Quando todas as vozes invadem-nos a mente
Miram nossa alma e em coro clamam: não.
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